O Processo da Cerâmica Artesanal: Quais são as etapas e quando tempo demora cada uma?

A arte da cerâmica é uma prática ancestral que envolve a manipulação habilidosa da argila para criar peças únicas e duráveis. Desde os tempos antigos até os dias atuais, os ceramistas dominam uma série de técnicas refinadas para transformar a matéria-prima em belas obras de arte. Neste artigo, vou compartilhar com vocês as etapas essenciais da produção da cerâmica artesanal, desde a preparação da argila até a queima final, para que possam assim compreender melhor o tempo necessário de cada etapa, que irá variar de peça para peça de acordo com sua complexidade e uma infinidade de fatores.

Preparação da Argila (Sova)

O primeiro passo no processo de produção da cerâmica é a preparação da argila, conhecida como "sova". Nesta etapa, a argila é retirada de depósitos naturais ou adquirida comercialmente e preparada/beneficiada para o uso. A argila é um material maleável e plástico que precisa ser amassado e misturado para garantir uma consistência homogênea e adequada para modelagem. Durante a sova, a cerâmica pode ser enriquecida com outros materiais, para alterar suas propriedades físicas e estéticas, tudo vai depender do objetivo final que o ceramista quer atingir com aquela peça. Geralmente é a etapa mais simples e mais rápida do processo.

 

Modelagem: Execução da Técnica de Modelagem

Após a sova, a argila está pronta para ser moldada de acordo com a criatividade e visão do ceramista. A modelagem é a fase em que a argila é manipulada para criar formas específicas, e pode ser utilizada de várias técnicas, como placa, torno, pinch pot, rolagem ou até mesmo moldes. A técnica utilizada varia de acordo com o ceramista e com a ideia final que ele quer executar. Esta etapa requer habilidade técnica e sensibilidade artística para dar vida à essas ideias, sejam elas peças utilitárias, esculturas ou qualquer outra peça imaginável.

O tempo dessa etapa de modelagem pode variar significativamente dependendo de vários fatores, incluindo o tamanho e complexidade da peça, assim como técnica utilizada para fazer a peça. Por exemplo, uma pequena tigela simples modelada à mão (feita no torno) pode ser criada em questão de horas, enquanto um grande vaso esculpido manualmente ou uma escultura detalhada podem exigir dias ou semanas de trabalho.

Em resumo, não há um tempo fixo para modelar uma peça de cerâmica, pois isso depende de uma variedade de fatores. Cada peça é única e requer um tempo e esforço específicos para ser criada com sucesso. Diferente do trabalho industrial, onde máquinas são programadas para executar movimentos repetitivos em um determinado tempo, a arte da cerâmica envolve uma série de fatores e habilidades onde o tudo depende, inclusive o seu tempo de criação.

 

Secagem e Acabamento

Após a modelagem, as peças de cerâmica passam por um processo de secagem gradual. Inicialmente, as peças recém-moldadas estão úmidas e frágeis, e ainda estão molhadas. Conforme a água evapora da argila, as peças atingem um estágio intermediário chamado "ponto de couro", no qual ainda estão maleáveis o suficiente para receber ajustes finos, como acabamentos e/ou adições decorativas e funcionais (como adicionar alças).

Depois de completamente moldada para o seu "formato final" a peça é então deixada para secagem, até chegar em ponto de osso. Esse processo em si pode variar imensamente de acordo com o local onde você faz suas peças pois o clima desempenha um papel significativo no processo de secagem de peças cerâmicas, pois afeta diretamente a taxa de evaporação da umidade da argila. Logo não há um tempo definido, mas sim fatores que precisam ser controlados para que suas peças não sequem muito rápido ou de maneira errada e acabem rachando ou empenando (o que é muito fácil de acontecer se os devidos cuidados não forem tomados). Alguns fatores que vão influenciar no tempo de secagem são:

  1. Umidade Relativa do Ar: A umidade relativa do ar, que é a quantidade de umidade presente na atmosfera em relação à quantidade máxima que poderia estar presente, afeta diretamente a taxa de evaporação da água da superfície da argila. Em áreas com alta umidade relativa, como regiões tropicais, a evaporação da água da argila é mais lenta, prolongando o tempo de secagem das peças. Em contraste, em áreas com baixa umidade relativa, como desertos, a evaporação é mais rápida, resultando em um processo de secagem mais rápido.

  2. Temperatura: A temperatura ambiente também desempenha um papel importante na secagem das peças cerâmicas. Temperaturas mais altas aceleram o processo de evaporação da água, enquanto temperaturas mais baixas retardam a secagem. Em climas quentes, as peças tendem a secar mais rapidamente, enquanto em climas frios, o processo de secagem pode ser mais lento e requerer um tempo prolongado para conclusão.

  3. Ventilação e Circulação de Ar: A ventilação e a circulação de ar no ambiente de secagem influenciam diretamente na remoção da umidade das peças cerâmicas. Um ambiente bem ventilado e com boa circulação de ar facilita a evaporação da água da superfície da argila, acelerando o processo de secagem. Por outro lado, em ambientes fechados e com pouca circulação de ar, a secagem pode ser mais lenta e menos uniforme.

  4. Exposição ao Sol e ao Vento: A exposição das peças cerâmicas ao sol e ao vento também pode afetar sua taxa de secagem. A luz solar direta e o vento ajudam a evaporar a umidade da argila mais rapidamente, acelerando o processo de secagem, e não é recomendado podendo levar a rachaduras ou deformações nas peças cerâmicas, especialmente se forem muito finas ou seções específicas secarem mais rapidamente do que outras.

Finalmente, após a secagem em um ambiente controlado, as peças alcançam o "ponto de osso", onde estão quase secas e prontas para serem queimadas.

Primeira Queima

Após a secagem completa, as peças são submetidas à primeira queima, também conhecida como queima de biscoito. Esta queima ocorre em fornos especiais, onde as peças são aquecidas a altas temperaturas, geralmente entre 800°C e 1000°C. Durante este processo, a argila é transformada em cerâmica sólida, perdendo sua natureza porosa e tornando-se mais resistente. Esta etapa prepara as peças para receber o acabamento e a esmaltação.

A queima em si pode variar de 8 - 11 horas, porém a preparação das peças para o forno também demanda tempo, assim como atenção aos detalhes.

  1. Preparação das Peças: Antes de colocar as peças no forno, é necessário garantir que estejam secas e livres de qualquer umidade residual. Isso pode envolver um período de secagem adicional, especialmente se as peças forem grandes ou espessas.

  2. Carregamento do Forno: Colocar as peças no forno de forma adequada é crucial para garantir uma queima uniforme. As peças devem ser organizadas de maneira que o calor possa circular livremente ao redor delas, evitando pontos frios ou superaquecidos (as peças não podem ficar acumuladas em um ponto do forno, enquanto outro ponto fica completamento vazio, por exemplo - é preciso pensar na circulação uniforme de ar para que o forno atinja a temperatura certa em todos os lugares).

  3. Programação do Forno: O forno deve ser programado com o ciclo de queima apropriado, que inclui uma rampa de aquecimento gradual para evitar choques térmicos e garantir que as peças aqueçam uniformemente. Isso geralmente leva algum tempo, dependendo do tipo de forno e das especificações de queima.

  4. Período de Queima: O tempo real de queima das peças no forno pode variar de acordo com diversos fatores, incluindo o tipo de argila e esmalte utilizados, o tamanho e espessura das peças, e as características específicas do ciclo de queima. Como mencionado, isso geralmente varia de 8 a 11 horas, mas pode ser mais longo em alguns casos.

  5. Resfriamento: Após a queima, as peças devem esfriar gradualmente no interior do forno para evitar rachaduras ou deformações. Isso também pode levar várias horas, dependendo da temperatura do forno e das características do ciclo de resfriamento (podendo passar de 24 horas dependendo do tamanho do forno, quanto maior, mais tempo de resfriamento).

Portanto, o tempo total necessário para a primeira queima da cerâmica inclui não apenas o período de queima em si, mas também a preparação das peças e o resfriamento subsequente. É um processo que demanda muito cuidado para garantir resultados satisfatórios.

 

Acabamento em Ponto de Biscoito

Após a primeira queima, as peças de cerâmica passam por um processo de acabamento, onde são lixadas e polidas conforme necessário. Esta etapa é crucial para garantir que as peças tenham uma superfície lisa e uniforme, pronta para receber a camada de esmalte. Geralmente essa etapa é feita com uma lixa manual, pois é necessário ter controle e precisão para dar um acabamento delicado e polido, portanto pode ser uma etapa longa e demorada, podendo se estender de horas para alguns dias dependendo da quantidade ou complexidade das peças. pois exige atenção e muito cuidado. A peças tem que ser bem limpa depois e sem presença de nenhum pó residual para não danificar a peça na proxima etapa de produção, que é a esmaltação. 

Esmaltação

A esmaltação é o processo de aplicação de uma camada de esmalte cerâmico nas peças, que nada mais é que um conjunto de minerais em pó, que é misturado com água e muitas vezes CMC, para que esse pó possa aderir na peça. O esmalte cerâmico é o responsável por proporcionar cor, brilho e uma camada de proteção extra. Os esmaltes podem ser formulados a partir de uma variedade de materiais, como minerais, óxidos metálicos e vidrados, e são aplicados manualmente com pincel, por imersão, banho ou compressor de ar entre outros. A escolha do esmalte influencia significativamente a aparência final das peças, oferecendo uma ampla gama de cores e texturas. E a escolha da técnica influência diretamente o tempo para esmaltação ser completa. Peças com muitos detalhes e feitas com pincel, no geral demandam mais tempo podendo demorar dias para serem finalizadas, enquanto banho e imersão são mais rápidos e uma peça pode ser esmaltada em alguns minutos.

 

Segunda Queima

Após a aplicação do esmalte, as peças são submetidas à segunda queima, também conhecida como queima de esmalte. Durante este processo, as peças são aquecidas a temperaturas mais altas do que na primeira queima, geralmente entre 1000°C e 1300°C. Esta temperatura derrete o esmalte, fundindo-o com a superfície da cerâmica e criando um revestimento vítreo durável e resistente. 

O tempo de duração da segunda queima irá contemplar os mesmo pontos da primeira queima ( preparação das peças, carregamento do forno, periodo da queima e resfriamento), porém o do forno será mais meticuloso pois as peças não podem se encostar - se não irão se fundir e grudar - e tempo será mais longo. Em muitos casos, a segunda queima pode durar de 6 a 10 horas, dependendo das características específicas das peças e do processo de queima. Assim como na primeira queima, é importante seguir um ciclo de queima gradual, com rampas de aquecimento e resfriamento cuidadosamente controladas, para garantir resultados satisfatórios e evitar danos às peças.

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É fundamental considerar a capacidade total do forno ao realizar queimas, pois ligá-lo com menos de sua capacidade máxima pode aumentar os custos por peça. Portanto, é mais vantajoso para o ceramista aguardar até que o forno esteja completamente cheio antes de realizar a queima, o que também requer planejamento para produzir peças suficientes para encher o forno.

No caso de ceramistas que dependem de terceiros para realizar as queimas, o processo pode ser ainda mais demorado devido à disponibilidade do forno de outras pessoas. Isso não apenas adiciona tempo ao processo de produção, mas também pode acarretar custos adicionais, como despesas de transporte para levar e buscar as peças, considerando sua delicadeza e a necessidade de cuidados especiais durante o transporte.

Portanto, tanto para ceramistas que têm seus próprios fornos quanto para aqueles que dependem de terceiros, o planejamento cuidadoso do tempo e dos custos é essencial para garantir uma produção eficiente e econômica de peças de cerâmica.

Em suma, o processo de produção da cerâmica artesanal é uma jornada complexa e fascinante, que combina habilidade técnica, criatividade e paciência. Desde a preparação da argila até a segunda queima, cada etapa é crucial para criar peças únicas e atemporais que celebram a beleza e a durabilidade da cerâmica como uma forma de arte tradicional e contemporânea.

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